Este espaço também é vosso

Este espaço também é vosso

30 de Março, 2021 140 Por Pai paratodaaobra

Quando tomei a decisão de criar este projeto, fi-lo muito por incentivo das pessoas que me rodeavam e de tantas outras que não conhecia mas que me mandavam mensagens a fazer questões sobre o processo de adoção e sobre a minha história, em particular. Ponderei e amadureci a ideia e decidi que, de facto, o “mundo” merecia conhecer a nossa história. Afinal, as histórias de amor devem, sempre, ser partilhadas. Foi isso que me norteou e no dia 19 deste mês nasceu este espaço, criado pela maravilhosa equipa da FVD – creative agency, responsável por toda a imagem deste projecto.

Acreditei, portanto que havia espaço e até, talvez, necessidade de abordar os três grandes temas a que me propus: a parentalidade exercida exclusivamente no masculino, a parentalidade pela via da adoção e ainda a parentalidade e as famílias compostas por ou com pessoas LGBTI+.

Imaginei que com o tempo, as pessoas se sentissem à vontade para me confiar algumas histórias da sua vida e até que me pedissem uma ou outra orientação sobre a parte processual da adoção, dado que já passei por ela.

O que não imaginava, de todo, é que pouco mais de uma semana depois do lançamento deste projeto estivesse a escrever este texto. E porquê? Porque nunca me passou pela cabeça que em tão pouco tempo me chegassem tantas pessoas, de tantos quadrantes, com tantas experiências diferentes dispostas a partilhar um pouco da sua vida e com vontade de se envolverem nesta onda de amor que este projeto pretende ser. E posso dizer-vos que escrevo de coração cheio com tantas, mas tantas mensagens que me chegaram, que seria impossível referir todas.

Ainda assim – e com a devida autorização de quem as enviou – partilho convosco um pequeno excerto de três dessas histórias.

A primeira veio de um homem que, com toda a frontalidade e humildade, me disse reconhecer que é fruto de uma sociedade e uma educação estruturalmente assentes no preconceito e que não podia negar que, embora hoje encare uma família homoparental de forma diferente de há uns anos, tinha que assumir que “há coisas que ainda fazem confusão”. Consciente de que o preconceito se destrói de dentro para fora disse-me, ainda, que está num processo “para encarar as coisas com total normalidade”. Por fim, disse-me que ouvir a minha história num live do instagram e acompanhar o “paipratodaaobra” foi mais uma ajuda para esse processo de desconstrução.

A segunda veio de uma mulher que me contou a história da sua família para terem um filho. As tentativas de engravidar, os tratamentos de fertilidade, o desgaste físico, emocional e psicológico. As dúvidas, os medos, a ansiedade de não se chegar aonde mais se deseja. E ao longo de todo este processo a hipótese que colocavam de uma eventual parentalidade pela via da adoção. E aí novamente o medo, a ansiedade e a dúvida que tudo isso acarretava. Quando decidiram parar as tentativas de gravidez, deram-se o tempo necessário de luto. O desejo de parentalidade permanecia e a adoção podia ser um caminho. Mas as feridas, ainda recentes, traziam mais medo do que certeza. Perguntou-me se não hesitei ou se tive medo. Perguntou-se se nunca duvidei que seria capaz. A verdade – talvez por uma boa dose de insconsciência – é que nunca tive medo. Achei sempre que fazia parte do meu caminho, disse-lhe. Perguntou-me por onde começar. E acabámos a conversa com esta mulher a dizer-me que, muito provavelmente, iriam agendar a sessão de formação A, para ponderarem a possibilidade de adoção.

A terceira história veio pela voz de um homem com idade semelhante à minha. Mas a perspetiva era precisamente a contrária. Este homem foi adotado. Mas nunca lhe contaram. Nunca lhe permitiram que soubesse a sua verdadeira história, a sua origem. Cresceu com a dúvida a vida inteira. Cresceu com o confronto das abissais diferenças físicas entre si, o pai e a mãe e um irmão. E com os comentários que isso gerou, toda a sua vida. Segundo conta, ter-lhe-ão dito que houve uma conversa quando era criança. Ele não se lembra. Lembra-se, sim de há cerca de seis anos, o seu telefone ter tocado. Era a sua irmã biológica do outro lado. Foi ela que lhe contou, quando ele tinha cerca de trinta anos, o que toda a vida lhe esconderam. E no fim de tudo isto, este homem afirma perentoriamente que sabe que o pai e a mãe que conheceu toda a vida fizeram o melhor que sabiam e considera-se um privilegiado. Este homem pediu-me – sim, pediu-me – para que a verdade e a transparência guiassem, sempre, os princípios da nossa família. E aqui, publicamente, deixo-lhe a promessa que assim será.

É difícil em tão poucas linhas, conseguir descrever as emoções que estas e outras histórias me provocaram e o quanto eu me sinto feliz e realizado por sentir que o paipratodaaobra tem servido para tantas e tão maravilhosas partilhas.

Termino a dizer que “espalhar amor” é, de facto, o principal objetivo deste projeto e, por isso, não há palavras que descrevam a minha gratidão para com todas as pessoas que nos seguem e decidem partilhar-se connosco.

Este espaço também é vosso. Sejam muito bem vind@s