A escolha das pretensões – Episódio 5

A escolha das pretensões – Episódio 5

23 de Abril, 2021 4 Por Pai paratodaaobra

Antes de avançar para o momento “pós processo” e de vos falar sobre a gestão de expetativa e ansiedade, decidi fazer uma publicação dedicada, exclusivamente, à escolha das nossas pretensões em relação à criança.

As pretensões são as condições particulares de cada criança com que estamos, ou não, dispostos a lidar. Muitas pessoas têm entrado em contacto comigo, acerca deste aspeto. Algumas acham que não podemos fazer nenhuma escolha e que é “venha quem vier” e outras, ao contrário, imaginam que pode escolher-se até a cor dos olhos. Nem uma coisa, nem outra. As pretensões não são um catálogo, mas também não seria adequado não avaliar necessidades e expectativas.

A escolha das pretensões tem um papel fundamental em todo o processo. Por dois motivos: Primeiro, porque quanto mais honestas e sinceras as nossas escolhas, maior probabilidade de acontecer um “match” adequado às necessidades da criança e às expectativas da família. E depois porque também são essas escolhas que irão determinar, em certa medida, o tempo de espera. Já aqui referi, inclusivamente, números que o provam. (Podem reler, aqui)

Não existe um momento de confronto e pronto. No meu caso, as técnicas da SCML entregaram-me um documento com todas as características de crianças que já passaram por processo de adoção, por forma a garantir a maior abrangência possivel. Ou seja, se houve, pelo menos, uma criança com determinada característica física, psicológica ou de saúde, essa situação passa a integrar esta lista de pretensões.

A entrega do documento é feita, logo, na primeira entrevista e o objetivo é que seja entregue, apenas, no fim do estudo de candidatura. Isto garante-nos tempo, espaço e privacidade para refletirmos a sós e em família sobre aquilo com que estamos preparados para lidar. Posso dizer-vos que este confronto com as minhas limitações e preconceitos foi, provavelmente, a fase mais dura de todo o processo. Há muitas coisas sobre as coisas nunca tinha ouvido falar e outras que nunca me tinham ocorrido, mas que são possibilidades: síndrome de feto alcoólico, pé boto, peito escavado, abandono total sem registo, sequer, do dia de nascimento. Estas e muitas outras características da criança e da família biológica, constam desse documento.

E a dúvida é grande: Qual é o limite? Até onde consigo ir? Estou ou não preparado para lidar com esta ou aquela situação?

Por outro lado, sabemos que quanto mais alargadas forem as pretensões, menos tempo demorará a chegada da criança. Mas também sabem que não é sensato alargar pretensões só para diminuir o tempo de espera e correr o risco imenso de provocar sofrimento à criança e à família, por não estar preparada para lidar com alguma coisa.

Todas as pretensões são legítimas e se, de facto, uma família quer apenas uma criança até um ano, ou só quer realmente um rapaz ou uma rapariga, enfim, seja qual for a pretensão, ela deve ser respeitada, mesmo tendo a consciência de que isso poderá significar um tempo de espera muito superior.

Em cada característica apresentada, podemos escolher: “aceito”, “não aceito” ou “a refletir/ponderar”. A minha decisão foi, em tudo em que eu tinha alguma dúvida acentuada, optei por escolher a opção “não aceito”. Não temos nem devemos aceitar tudo, se isso nos deixar numa posição desconfortável. A mim, ajudou-me o facto de nunca ter perdido de vista que se tratava do meu filho ou filha. E que, uma vez chegad@, jamais voltaria a sair do meu colo.